Em O Poder Normativo do Direito, ficou demonstrado que a teoria kelseniana de validade das normas não é adequada. Para Kelsen, de certo modo, a normatividade existe em virtude do fato de que cada uma das normas só é norma, ou seja, só é tida como válida para regular condutas, porque deriva sua validade de uma outra norma anterior (link ou vínculo de validade), terminando a cadeia naquela que é historicamente a primeira Constituição.
Assim considerada a normatividade do Direito, a primeira Constituição, enquanto lei ou leis positivas, não tem garantida sua validade, pois uma norma só é válida dentro de um sistema quando está autorizada por uma outra superior.
Contudo, para Kelsen, a definição de um sistema jurídico não termina na primeira Constituição. A ela se deve obediência porque
é postulado que devemos nos conduzir como o indivíduo ou os indivíduos que estabeleceram a primeira Constituição prescreveram. Esta é a norma fundamental da ordem jurídica em consideração.
Porém, a tentativa de Kelsen resta fracassada, porque não faz parte de sua definição (de vínculo de validade) a condição de que as normas pertencentes a um (único) sistema devem fazer parte apenas de uma só cadeia de validade.
A crítica à teoria kelseniana reside no fato de que ela não consegue explicar satisfatoriamente como normas de diferentes sistemas jurídicos podem coexistir ou interagir. Por exemplo, em contextos de pluralismo jurídico, como em sociedades multiculturais, é comum que diferentes sistemas normativos (como o Direito estatal, o Direito consuetudinário e o Direito religioso) operem simultaneamente. Nesses casos, a ideia de uma única cadeia de validade, tal como proposta por Kelsen, mostra-se insuficiente para abarcar a complexidade das relações entre as normas.
Além disso, a teoria de Kelsen enfrenta dificuldades ao tentar justificar a validade da primeira Constituição. Se uma norma só é válida porque deriva de outra superior, como explicar a validade da norma fundamental (Grundnorm), que não deriva de nenhuma outra norma? Kelsen responde a isso com um postulado, mas essa solução é frequentemente criticada por ser circular e por não oferecer uma base sólida para a validade do sistema jurídico como um todo.
Outro ponto de crítica é que a teoria kelseniana não leva em consideração o papel da moral e dos valores sociais na formação e na aplicação das normas jurídicas. Para autores como Ronald Dworkin e Joseph Raz, o Direito não pode ser compreendido apenas como um sistema fechado de normas, mas deve ser visto como uma prática social que envolve interpretação, princípios e valores. Essa perspectiva amplia a compreensão do Direito para além da mera validade formal, incorporando elementos como a justiça, a equidade e a legitimidade.
Em resumo, embora a teoria de Kelsen tenha sido fundamental para a compreensão do Direito como um sistema normativo autônomo, suas limitações obrigam um diálogo com outras abordagens teóricas. A crítica à sua visão de validade das normas abre espaço para reflexões mais profundas sobre a natureza do Direito e sua relação com a sociedade, a moral e os valores humanos.
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